Recentemente, o presidente de uma montadora de automóveis alemã disse que “luxo é ser sustentável”, em referência à nossa relação com os carros. Luxo mesmo foi quando andei em um carro autônomo, em uma Autobahn (Estradas de Alta Velocidade), na Alemanha.
Uma estrada de alta velocidade não significa sem regras. E, vale lembrar, que na Alemanha estão as rodovias mais seguras do mundo. A velocidade sugerida é de 130 km/h, mas também indica que a mínima é de 60 km/h – e é proibido dirigir abaixo dessa velocidade. E, sim, em alguns trechos existem radares e em outros trechos permitem que a velocidade seja ilimitada.
Ter essa “liberdade” para dirigir em alta velocidade e conduzir carros autônomos, parece algo futurista. De certa forma é. Porém, como disse, para tudo há regras.
Se transferirmos isso para a medicina, vamos observar que também é possível ter liberdade com o que fazemos com o nosso corpo. No entanto, sempre haverá limites.
Quanto mais autônomos podemos ser, também estaremos mais expostos a riscos. E esse tem sido a tônica que muitos médicos já descobriram no dia a dia com seus pacientes. Alguns indivíduos respeitam seus próprios limites, outros não.
Hoje, o médico pode ser um bom orientador para seus pacientes, mas não um condutor, e muito menos “autônomo”. Para fazer análises prévias de doenças, sobre o diagnóstico, o tipo de tratamento e procedimentos é preciso mais orientação do que condução do paciente. Até porque, quando paciente e médico conversam sobre os cuidados com a saúde, os resultados sempre são melhores, ganham em eficiência.
Fazendo uma analogia, se você tiver prudência (paciente/motorista) e souber respeitar os limites do corpo (médico/leis), a saúde pode “andar” a 130 km/h ou a 60 km/h.
A partir de certa idade é preciso colocar o pé no freio
Observando a estrada da ciência, da medicina e dos programas de saúde, fica evidente que precisamos colocar o pé no freio. É claro que até um determinado momento da vida nós aceleramos muito, cometemos imprudências, dirigimos sem freio e sem limites, sobretudo com o nosso corpo. Mas, a partir de uma certa idade, por volta dos 40 anos, começar a reduzir a marcha, respeitar mais os sinais e as leis da física do corpo.
E foi justamente com essa observação que me deparei com alguns números que precisam ser alertados. A Organização Mundial da Saúde (OMS) tem uma plataforma que apresenta estatísticas globais do câncer – para todos os tipos de cânceres. O Global Cancer Observatory (GCO) tem realizado um trabalho fantástico e que nos permite enxergar milhas e milhas à frente.
A ferramenta do Global Cancer Observatory traz indicativos do número de casos de câncer em todo mundo, com dados sobre incidência futura de câncer e a carga de mortalidade, a partir das estimativas atuais de 2018 até 2040.
18,1 milhões de casos de câncer em 2018
Em todo mundo, a incidência total de câncer em 2018 foi de 18,1 milhões de casos. Para 2040, este número sobre para 28,5 milhões. No meu caso, olhei para o velocímetro que marca os cânceres de próstata. O órgão da OMS aponta que a incidência estimada de casos de câncer de próstata para todas as idades, em 2040, é de 2.293.818. Para a faixa acima dos 70 anos, de 1.330.420. Até 2040, a mortalidade será de mais de 625.000 entre indivíduos acima dos 70 anos.
Os números não são muito melhores especificamente no Brasil. Em 2018, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), foram diagnosticados no país mais de 68.000 casos de câncer de próstata, 31,7% a mais em relação às demais neoplasias, e 15.391 mortes (com dados de 2017).
Por isso, as campanhas de prevenção são extremamente importantes. A campanhaSetembro Amarelo, com o alerta para o suicídio, mostrou mais uma vez, conforme dados do DataSUS, que o número de suicídios vem aumentando no Brasil nos últimos anos. Na sequência, temos o Outubro Rosa, um movimento internacional de conscientização para o controle do câncer de mama. E, logo mais, o Novembro Azul, mês mundial de combate ao câncer de próstata, que causa a morte de um homem a cada 38 minutos.
Com os dados que temos hoje e com as campanhas de alerta para diversas doenças e síndromes, não podemos deixar que a medicina seja autônoma, no sentido de deixar correr sozinhos nossos pacientes, sem alertas, sem freios, sem limites. Se é luxo ser sustentável, muito mais luxo é viver com qualidade.
E observar que a liberdade com a nossa saúde depende de regras, que podem ser estabelecidas entre médicos e pacientes, mas com a certeza de que existem radares por aí, como freios que nos fazem lembrar a todo instante as campanhas de conscientização em prol da população.
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