O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o terceiro dia de julgamento sobre a prisão após condenação em segunda instância com quatro votos a favor dessa tese e três contra.
Nesta quinta-feira, votaram os ministros Rosa Weber, Luiz Fux e Ricardo Lewandowski. Faltam os votos de Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli.
O julgamento será retomado no dia 6 ou 7 de novembro. O presidente do tribunal, Dias Toffoli , informou que anunciará a data na próxima segunda-feira (28).
COMO VOTARAM OS MINISTROS
A FAVOR DA 2ª INSTÂNCIA | CONTRA A 2ª INSTÂNCIA |
Alexandre de Moraes | Marco Aurélio Mello |
Edson Fachin | Rosa Weber |
Luís Roberto Barroso | Ricardo Lewandowski |
Luiz Fux |
Ao final do julgamento, o Supremo vai definir o momento em que uma pessoa condenada poderá ser presa: se após condenação em segunda instância, com a execução provisória da sentença, ou se somente após o chamado trânsito em julgado (quando estiverem esgotadas todas as possibilidades de recurso).
Nesta quinta-feira (24), a ministra Rosa Weber e o ministro Ricardo Lewandowski se posicionaram contra a prisão após condenação em segunda instância; Luiz Fux votou a favor.
Na quarta-feira (23), o relator, ministro Marco Aurélio Mello, votou contra e os ministros Alexandre de Moraes, Luiz Edson Fachin e Luís Roberto Barroso, a favor.
Uma eventual mudança na atual jurisprudência do STF – caso o tribunal decida contra a prisão após condenação em segunda instância – poderia, em tese, beneficiar quase 5 mil presos, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Mas isso vai depender da análise caso a caso. Presos considerados perigosos ou que estiverem detidos preventivamente, por exemplo, não poderão ser soltos.
Um dos casos de maior repercussão relacionado ao tema é o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex em Guarujá (SP).
O ex-presidente, preso desde abril de 2018, poderá deixar a prisão caso o STF decida que alguém só pode ser preso depois que não houver mais possibilidade de recursos na Justiça.
Nos casos do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, entretanto, a eventual mudança de entendimento do STF não os tira da cadeia.
Levantamento do Ministério Público Federal indica que uma eventual decisão contra a prisão após condenação em segunda instância pode beneficiar 38 condenados na Operação Lava Jato.
Ministros que votaram nesta quinta (24)
Saiba os argumentos utilizados pelos ministros que votaram na sessão desta quinta-feira (24):
Em seu voto, a ministra Rosa Weber se manifestou contra a possibilidade de prisão de condenados em segunda instância, afirmando que a presunção de inocência é “garantia fundamental” prevista na Constituição que não pode ser lida “pela metade”.
“Trata-se, na minha visão, de amarra insuscetível de ser desconsiderada pelo intérprete, diante da regra expressa veiculada pelo constituinte ao fixar o trânsito em julgado como termo final da presunção de inocência. No momento em que passa a ser possível impor aos acusados os efeitos da atribuição da culpa, não é dado ao intérprete ler o preceito constitucional pela metade, ignorando a regra”, afirmou Rosa Weber.
A ministra defendeu que o Estado deve observar as garantias asseguradas pelo próprio Estado. “Goste eu pessoalmente ou não, esta é a escolha politico-civilizatória estabelecida pelo Constituinte. Não reconhecê-la, com a devida vênia, é reescrevê-la para que espelhe o que gostaríamos que dissesse”, declarou.
Segundo a ministra, “em uma época na qual sobeja a desconfiança do povo em relação a seus representantes e o descrédito da atividade política” não é difícil, afirmou Rosa Weber, “ficar tentado a uma interpretação do texto constitucional que subtraia garantias e proteções”.
“Vale lembrar que história universal é farta de exemplos de que a erosão das instituições garantidoras da existência dos regimes democráticos, quando ocorre, lenta e gradual, normalmente tem origem na melhor das intenções: moralidade pública, eficiência do estado, combate à corrupção e à impunidade”, afirmou a ministra.
Rosa Weber afirmou que aplicou o entendimento tomado em 2016 pela maioria dos ministros em 66 decisões individuais, mas sempre salientando que daria seu voto no momento apropriado, o do julgamento das ações declaratórias. “Minha leitura constitucional sempre foi e continua a ser exatamente a mesma”, afirmou.
A ministra disse que a jurisprudência “comporta revisita, a sociedade avança, o direito a segue”, mas defendeu “cuidado com as maiorias ocasionais”.
Rosa Weber também comentou julgamento de 2016, do qual não participou, no qual o plenário virtual da Corte decidiu manter válida a possibilidade de prisão em segunda instância.
“Minha postura frente ao estado da arte naquele momento foi a de acatar o entendimento sedimentado pelo plenário, vale dizer, a de decidir em conformidade com a jurisprudência do STF, em atenção ao dever de equidade e em respeito ao princípio da colegialidade”, afirmou.
O ministro Luiz Fux deu o quarto voto a favor de permitir prisões de condenados em segunda instância.
Em seu voto, o ministro Luiz Fux criticou uma mudança de jurisprudência atual da Corte neste momento.
“A mudança de precedente não pode se fazer sem uma motivação profunda. Nós estamos aqui desde 2016 dizendo: ‘essa regra é salutar, ela evita a impunidade’. E agora nós vamos mudar por quê? Qual a razão de se modificar a jurisprudência?”
Para Fux, a presunção de inocência “não tem nenhuma vinculação com a ideia de prisão”.
O ministro citou casos emblemáticos como o da menina Isabella Nardoni, do menor Champinha e do ex-jornalista Antônio Marcos Pimenta Neves, que matou a namorada, afirmando que “perpassam pela lógica razoável de aguardar o trânsito em julgado para iniciar a execução”. “Matou pelas costas, confessou crime e só foi preso 11 anos depois.”
“O direito não pode viver apartado da realidade”, argumentou o ministro. “Isso é justiça? Será que é essa a Justiça que se espera de um tribunal? Vamos contemplar e só depois iniciar a execução de pena?”
Para o ministro, esgotadas as instâncias ordinárias, a primeira e segunda instância, “tem-se considerável força de que o réu é culpado”.
“O que a Constituição quer dizer é: até o trânsito em julgado, o réu tem condições de provar sua inocência. À medida em que o processo vai tramitando, essa presunção de inocência vai sendo mitigada. Há uma gradação”, defendeu.
Segundo Luiz Fux, os tribunais superiores não admitem reexame de fatos e provas. “Esse homem vai ingressar no Supremo Tribunal Federal inocente, com presunção de inocência?”
O ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o relator, ministro Marco Aurélio Mello, e a ministra Rosa Weber, contra a prisão após condenação em segunda instância.
Lewandowski disse que as mudanças na Constituição não poderão tornar vulneráveis as garantias previstas na Carta.
Citando cláusulas pétreas da Constituição, Lewandowski afirmou que entre estas cláusulas está a presunção de inocência, a “salvaguarda do cidadão”.
“Salta aos olhos que, em tal sistema, ao qual de resto convive com a existência de 800 mil presos encarcerados em condições subumanas, com 40% de prisões provisórias, em um estado de coisas inconstitucional, multiplica-se a possibilidade e cometimento de erros judiciais de magistrados de primeira e segunda instâncias. Daí a relevância da presunção de inocência”, defendeu.
“A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal consolidou-se, salvo por um breve lapso de tempo, no sentido de que ofende a presunção da inocência a execução provisória da pena, ressalvada a hipótese da prisão cautelar”, afirmou.
Segundo Lewandowski, a Constituição não é uma “mera folha de papel que pode ser rasgada sempre que contraria as forças políticas do momento”.
“A única saída legítima para qualquer crise em um regime que se pretenda democrático consiste justamente no incondicional respeito às normas constitucionais. Não se pode fazer política criminal contra o que dispõe a Constituição, mas sim, com amparo nela”, declarou.
G1