SAUDADES,POR BRANDÃO DE CARVALHO
Quando eu era uma criança interiorana na vasta solidão da fazenda Concórdia, dedilhando os livros que se encontravam nas estantes, no alto de uma escrivaninha, móvel adaptado às leituras da época “… ah que saudades que tenho, da aurora de minha vida, da minha infância querida, que os anos não trazem mais”.
Foi o primeiro poeta que contactei nas minhas primeiras investidas no âmbito da poesia, numa idade muito tenra. Daí, comecei a sentir as agruras da saudade, por ter saído daquele ambiente tão peculiar, com destino à capital piauiense.
Transportei-me ao poema saudade, o mais perfeito existente na literatura brasileira, do piauiense Da Costa e Silva:
“Saudade! Olhar de minha mãe rezando,
E o pranto lento deslizando em fio…
Saudade! Amor da minha terra… O rio
Cantigas de águas claras soluçando…
Saudade, Asa de dor do pensamento!
Gemidos vãos de canaviais ao vento…
As mortalhas de névoa sobre a serra…”
A saudade é uma dor que nos maltrata, mas ao mesmo tempo é um refrigério para o corpo e alma. Há uma frase perfeita sobre a recordação “recordar é viver duas vezes”.
A saudade nos transpõe aos umbrais dos nossos mais lídimos pensamentos, resgatando fatos, acontecimentos que de alguma forma marcaram a nossa trajetória de vida.
A saudade é a dor de uma ausência que temos o prazer de sentir. Não há nenhuma criatura humana isenta da saudade em sua vida…, do tempo de criança, dos amigos, dos primeiros madrigais que são os galanteios à pessoa amada, quando se inicia a fase da puberdade, com sonhos infantis, onde o “pecado” ainda é uma miragem a ser testado através dos hormônios um tanto revoltos naquele corpo em profusão de mudanças, em que tudo se converte para a sublimação de nossos intentos, ainda, sem o manto do “interesse” da atração exclusivamente sexual.
A saudade nos segue em todos os quadrantes de nossas vidas, vai se amontoando, se avolumando; a saudade não tem medida, ela pode se converter em lágrimas, prantos, mas ao mesmo tempo se transformar em alegria na sucessão dos períodos que ensejam essas mutações, no vai e vem dessa gangorra chamada vida.
A saudade é cantada e decantada em prosas e versos , na voz do artista, na “pena” do poeta, nos sussurros dos amantes, ardendo, as vezes em chamas nos corações de quem perdeu ou ganhou um novo amor.
Quem seria mais susceptível à saudade, o homem ou a mulher? O coração não tem limites, não tem gênero, ele é um órgão físico de nossa compleição e de nossos esteriótipos, mas na ambivalência de nossos sentimentos, o coração implementa o Amor em todas as suas formas… temos o registro da saudade que se contabiliza a medida que fazemos a nossa história nas encruzilhadas da vida.
Nunca fuja da saudade, quando ela bater em sua porta, abra seu coração, receba-a para que você possa reviver introspectivamente um filme que foi real e que hoje vive no imaginário de sua alma.