Sócrates, o pai da filosofia Ocidental, foi considerado um criminoso pelo Direito ateniense. E qual era o seu crime? Justamente ser contra as ideias de seu tempo, pelo qual pagou com a própria vida.
A posição divergente de Sócrates, naquele contexto da Grécia Clássica, serviu de base para o que hoje se conhece como liberdade de pensamento.
O exemplo de Sócrates me vem à lembrança quando presencio o brutal e prolongado cerco que se faz ao jornalista Arimatéia Azevedo, com o objetivo de silenciá-lo a qualquer custo.
Desde a Grécia Antiga, o mundo desaba sobre a cabeça dos que não se ajustam ao seu tempo.
Ponto fora da curva
Já contei isso e repito: há 40 anos, quando me iniciei no jornalismo, Arimatéia Azevedo já era o que hoje se convencionou chamar de um ponto fora da curva.
Em uma terra em que a imprensa se contentava passivamente com as versões oficiais, ele praticava incansavelmente o questionamento dos fatos, denunciava mazelas.
E foi assim que ele denunciou, por exemplo, uma armação policial que levou três jovens à prisão como acusados do cruel assassinato do empresário Helder Feitosa, em 1987.
Descoberta e denunciada a farsa, por uma investigação pessoal dele, os inocentes foram soltos, depois de sofreram muita tortura para confessarem um crime que não cometeram.
Até hoje nem a polícia nem a justiça mandaram prender os verdadeiros assassinos do empresário, que era dono do jornal O Estado, hoje extinto.
Crime organizado
Foi também a voz solitária de Arimatéia Azevedo que denunciou a existência do crime organizado no Piauí.
Essa organização só veio a ser investigada e desmantelada mais de dez anos depois de sua denúncia.
A organização era tão poderosa que só pode ser derrubada através de uma força-tarefa que reuniu a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal, entre outras instituições de peso.
O jornalista Arimatéia Azevedo enfrentou o crime organizado sozinho, sem um canivete, só com a cara e a coragem.
Pressões, ameaças e atentados
Só esses dois exemplos já serviriam para dimensionar a importância da ação profissional do jornalista. Mas toda a sua carreira é permeada de atitudes como estas.
É claro que isso sempre irritou a muita gente, principalmente aos poderosos de plantão e aos fora da lei.
Não sei quantas vezes ele perdeu o emprego por pressões exercidas contra as empresas de comunicação, nem quantas ameaças de morte recebeu, chegando a sofrer atentados em casa e no próprio local de trabalho.
Medida drástica
Em junho do ano passado, ele foi preso numa ação policial cheia de pirotecnia, sob a acusação de extorsão. Uma denúncia que não foi provada.
Só foi posto em liberdade por decisão do Superior Tribunal de Justiça, depois de passar mais de 5 meses amargando os dissabores de uma prisão e de ficar impedido de exercer sua profissão.
O STJ concedeu, por unanimidade, o Habeas Corpus que deu liberdade ao jornalista.
No julgamento, o ministro Rogerio Schietti Cruz ressaltou que a prisão preventiva foi uma medida muito drástica “sem até que se explicasse a insuficiência ou a inadequação de outras cautelas alternativas à medida mais gravosa”.
Em seu voto, a ministra Laurita Vaz reforçou a desproporção e ressaltou a fragilidade dos elementos elencados.
Nova prisão
Pois bem! Agora, em uma denúncia ainda mais desarrumada que a anterior, o jornalista é mandado de volta à cadeia.
Arimatéia Azevedo foi e é impecável no exercício de sua profissão? Não responderia afirmativamente. É provável que ele tenha errado, afinal, só não erra quem não tenta acertar.
E quem erra fazendo algum mal ou causando prejuízos a alguém deve pagar. Mas, num estado democrático de direito, como o que vivemos, isso deve ser feito na forma da lei, que assegura o amplo direito de defesa a qualquer acusado.
No caso de Arimatéa, antes do julgamento ou mesmo da investigação, vem a prisão.
Se os preceitos legais não vêm sendo minimamente observados, resta a indagação: a quem interessa calar e desmoralizar o jornalista Arimatéia Azevedo?