A sós, sem intermediários, Lula e Lira se reuniram a portas fechadas para uma conversa que precisava ser feita –e para dizer coisas que precisavam ser ditas– entre duas pessoas que até pouco mais de um mês não se conheciam. Nas palavras de um aliado de ambos, foi “uma conversa conceitual”.
Quem não conhece Arthur Lira (PP-AL) na política imaginava que ele poderia levar um tempo para conversar com Lula –mas quem convive com ele tinha certeza desse “bromance” desde que as pesquisas eleitorais passaram a cravar a vitória de Lula no segundo turno.
No final do segundo turno e no começo da transição, Lira deixou claro que tinha lado: o das regras do jogo democrático.
Pragmático, ele foi o primeiro futuro ex-bolsonarista a reconhecer o resultado das urnas. Lira conversou por telefone com Lula no domingo, 30 de outubro, logo depois da vitória do petista.
O presidente eleito disse que queria conversar pessoalmente com o presidente da Câmara, perguntou sobre o seu pai, o ex-senador Benedito de Lira, de quem afirmou gostar muito –assegurou ainda que, mais adiante, estaria em Brasília e iria procurá-lo.
Antes do tête-à-tête com Lula ontem, Lira se reuniu com integrantes da transição e com o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB).
Mas sempre disse, nos bastidores, que o interlocutor que ele esperava do governo Lula era… Luiz Inácio Lula da Silva. E que não haveria conversa se fosse Mercadante, homem-forte do governo Dilma.
Lula entendeu o recado ao assumir as rédeas da articulação política ainda na transição.
No encontro com Lira, deixou mais do que claro também que, na hora da garantias dos acordos políticos, o avalista é ele. No governo Lula 3, Lula é o “posto Ipiranga” do seu governo.
Para que essa dinâmica funcione –e passe credibilidade a agentes políticos, principalmente–, Lula busca auxiliares que executem o seu plano, mas quem negocia os termos é ele.
Por isso, cai como uma luva para Lula a fórmula de ter um ministro da Economia que seja da sua cozinha –como Fernando Haddad (PT)– e também um articulador político “da casa”, como Alexandre Padilha (PT).
Tudo o que Lula quer evitar é confronto com algum ministro que tenha agenda pessoal, que acabe por reeditar a figura de “superministro” e tente imprimir sua visão em áreas estratégicas do governo, como política e economia.
Sobre a relação Lira-Lula, quando alguém no PT torce o nariz para essa aproximação, um aliado de Lula costuma lembrar que o presidente da Câmara que Lula considera ter sido o que menos deu trabalho durante suas gestões 1 e 2, o mais profissional, foi… Michel Temer (MDB).
E que, se o PT atrapalhar a reeleição de Lira na Câmara sem chance de ganhar, como fez de forma traumática para o partido no caso Dilma-Cunha, Lira pode dobrar a aposta e trabalhar para inviabilizar o governo de diferentes formas, do controle da pauta na Casa ao impeachment.
Por isso, o custo-benefício de apoiar Lira por mais dois anos foi a tese vencedora na transição: Lira pode não ajudar nos próximos anos, mas não vai trabalhar para atrapalhar os planos do governo Lula. Como costumavam brincar aliados de Lira nos últimos anos: quando Lira decide ser adversário, “é um cara muito trabalhador”.
Além de ter fama de cumpridor de acordos, Lira repete a aliados, sempre que perguntado sobre sua postura à frente da Câmara, sobre a relação com Executivo e com Judiciário, que o seu caminho é reto. Que é estável, e que com ele não tem instabilidade.
É essa expectativa de estabilidade que fez Lula evitar caminhos tortos na Câmara dos Deputados comandada por Lira.
Fonte:g1