São Félix do Xingu, no Pará, tem, segundo o DataSus, 9% de sua população de 130 mil habitantes com a primeira dose da vacina contra Covid-19 Marco Santos/Agência Pará
Apesar de a vacinação contra a Covid-19 no Brasil andar em bom ritmo, há no país um número expressivo de municípios cuja adesão ao imunizante está abaixo dos 50% da população.
Autoridades locais alegam medo e resistência das pessoas para avançar com o programa de imunização.
Dados do Ministério da Saúde mostram que, ao todo, mais de 70% da população brasileira já receberam a primeira dose, e mais de 60% das pessoas estão com o esquema vacinal completo – ou seja, tomaram duas doses ou a vacina de dose única.
Isso coloca o Brasil bem acima da média global de imunização, que gira em torno de 40%.
Ainda assim, ao menos 50 municípios brasileiros estão bem atrás do parâmetro nacional, não tendo vacinado, sequer com a primeira dose, nem metade da população, e é possível que esse número seja ainda maior, considerando as dificuldades de acesso a dados e divergências de informações disponibilizadas pelos governos.
O cenário é um risco para o combate à pandemia no país, enquanto o mundo se preocupa com o surgimento de uma nova variante do vírus, a Ômicron, mais transmissível que as cepas anteriores, até onde se sabe.
Lideram a lista de cidades de baixa imunização localidades na região norte, em particular do Pará, Amazonas e Roraima. A CNN identificou ao menos 20 municípios apenas no Pará que não chegam a 50% da população com a primeira dose da vacina.
Há casos ainda em Rondônia, Acre, Mato Grosso, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
O levantamento foi feito, a pedido da CNN, a partir de um cruzamento de dados realizado pelo Laboratório de Estatística e Ciência dos Dados da UFAL (Universidade Federal de Alagoas), com os dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde e as estimativas populacionais do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Além disso, a reportagem checou as informações disponibilizadas pelas secretarias de saúde estaduais e municipais, e entrou em contato com algumas delas para confirmar e esclarecer os números.
Em comum, a maior parte desses municípios são predominantemente rurais, de largas extensões e pequena população.
Eles não têm seus vacinômetros atualizados há semanas, e algumas autoridades com as quais a CNN falou não sabem precisar ao certo quantas doses foram aplicadas -reconhecem, porém, que foram poucas.
No geral, secretários de Saúde municipais alegam que sobram vacinas, mas falta público. A CNN também acionou o Ministério da Saúde, que não respondeu.
Medo é maior dificuldade
Derradeiro na lista de taxas de imunização, São Félix do Xingu, no coração do Pará, é um município de mais de 84 km2 – quase o dobro do estado do Rio de Janeiro.
Segundo o DataSUS, apenas 9% de sua população de 130 mil habitantes recebeu a primeira dose da vacina contra Covid-19. Já o vacinômetro do governo do estado do Pará aponta um pouco mais: 18%.
“É medo, desinformação, fake news, religiosidade, fanatismo político”, diz o secretário de saúde Raphael Antônio de Lima Souza.
“Temos centro de vacinação até à noite, vacina à vontade, delivery, vacina em casa, tem tudo. Eu mesmo fui pessoalmente nos bairros. A cada cinco que conversava, convencia um. Falam que já pegaram Covid, ou que não pegaram até agora, não pegam mais, que tem chip na vacina, vão morrer daqui dois anos.”
O cenário se repete em Cachoeira do Piriá, leste de Belém. “Tem comunidade que fica a 130 km da sede, só chegamos em estrada de chão, e mesmo assim a gente chega”, relata o secretário de Saúde Keynes Lemos da Silva.
“Uma equipe volante percorre as comunidades, fazemos ações itinerantes, batemos de casa em casa, explicando a importância da vacina, mas as pessoas se escondem.”
De acordo com o vacinômetro do Pará, apenas 37% da população de Cachoeira do Piriá, de 34,6 mil habitantes, havia recebido uma dose do imunizante em dezembro.
“A logística do interior é complicada, mas estamos vacinando todos os dias, fazemos repescagem a cada 15 dias. Em vez de o público vir até a vacina, estamos levando a vacina até o público”, argumenta Gilberto Bianor, secretário de Placas, oeste do estado. A taxa por lá é de 33% de aplicação da primeira dose.
Ao todo, no Pará, 72,84% da população recebeu a primeira dose. Em Belém, na capital, foram 76,9%.
Mas há municípios que não aplicaram a primeira dose em nem sequer um terço das pessoas, como os já mencionados. O governo do estado avalia o cenário com preocupação.
“É necessário que o Estado avance na cobertura vacinal para garantir uma maior proteção à população”, respondeu em nota a Secretaria Estadual de Saúde.
Segundo a pasta, há dez municípios prioritários de atenção, selecionados a partir da avaliação dos dados epidemiológicos e de cobertura vacinal.
Além de São Félix do Xingu, estão na lista Altamira, Ananindeua, Cametá, Castanhal, Itaituba, Marabá, Redenção, Santarém e Tucuruí — embora a maior parte da lista já tenha vacinado uma porcentagem bem mais considerável da população.
CNN BRASIL