Um grupo de 131 delegados aposentados da PF (Polícia Federal) protocolou na PGR(Procuradoria Geral da República) uma notícia-crime contra o ministro do STFAlexandre de Moraes por suposto “abuso de autoridade” pela operação contra empresários que falaram em “golpe” em um grupo privado no WhatsApp.
Os delegados aposentados pedem abertura de inquérito contra Moraes e contra o delegado da PF Fábio Alvarez Shor, que fez os pedidos para busca e apreensão de celulares dos empresários e de quebra de sigilo telemático.
No documento, encaminhado ao procurador-geral da República, Augusto Aras, os delegados dizem que a operação adotou medidas desproporcionais e ilegais contra os investigados. Também criticam os argumentos que basearam a decisão de Moraes. Eis a íntegra da notícia-crime (788 KB).
O pedido é para que Aras “adote as providencias cabíveis” diante de possível suspeição de Moraes para exercer as funções de presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por suposta falta de“imparcialidade necessária”.
Notícias-crime funcionam como uma espécie de boletim de ocorrência: pessoas ou instituições informam que determinado crime pode ter sido cometido, e as autoridades decidem se vão ou não autorizar a investigação. Em geral, pedidos assim são encaminhados ao Ministério Público, órgão com competência para investigar e propor denúncias.
Em 19 de agosto, Moraes havia autorizado buscas contra 8 empresários, que foram realizadas 4 dias depois. Eis os empresários alvos da ação:
- Afrânio Barreira Filho, 65, dono do Coco Bambu;
- Ivan Wrobel, dono da W3 Engenharia;
- José Isaac Peres, 82, fundador da rede de shoppings Multiplan;
- José Koury, dono do Barra World Shopping;
- Luciano Hang, 59, fundador e dono da Havan;
- Luiz André Tissot, presidente do Grupo Sierra;
- Marco Aurélio Raymundo, conhecido como Morongo, 73, dono da Mormaii;
- Meyer Joseph Nigri, 67, fundador da Tecnisa.
Além dos mandados de busca e apreensão, Moraes também havia determinado:
- bloqueio de perfis dos empresários nas redes sociais;
- quebra de sigilo bancário; e
- bloqueio de contas bancárias.
“Qual violência ou grave ameaça os senhores ‘investigados’ praticaram contra qualquer Poder da República?”, questionam os delegados aposentados. “Todavia, observa-se um verdadeiro malabarismo jurídico na tentativa de impingir aos empresários infrações penais parecendo que tramavam num seguro e intransponível esconderijo de whatsapp! Na verdade, um ‘esconderijo’ que foi violado ou cujas mensagens foram vazadas, desconhecendo-se como chegaram ao domínio público”.
A notícia-crime ainda afirma que houve “enorme esforço” para relacionar as mensagens dos empresários ao que se apura no inquérito das fake news, que tramita no Supremo sob a relatoria de Moraes.
“Ora, acrescenta-se, ainda, que aquelas mensagens em whatsapp não constituem crimes de ameaça às instituições e nem longinquamente estariam pondo em grave risco a democracia e, consequentemente, não poderiam ser enquadradas como infrações penais, obviamente”, disseram.
Em nota, a presidente da Fenadepol (Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal), Tania Prado, disse que o pedido à PGR “não representa” a opinião da categoria.
“A representação formulada por um grupo minoritário de delegados da Polícia Federal aposentados à PGR não representa a opinião da categoria”, disse.
Em 15 de setembro, o ministro do STF determinou o desbloqueio das contas bancárias dos 8 empresários. Moraes entendeu que não haveria motivo para manter o bloqueio depois do 7 de Setembro. Na decisão, disse que o bloqueio havia sido necessário diante de “fortes indícios” da atuação dos investigados para “fornecer recursos para o alcance de objetivos escusos nos atos ocorridos durante o último feriado nacional de Independência do Brasil”.
Os indícios, conforme o ministro, “tornaram necessário, adequado e urgente o bloqueio das contas bancárias dos investigados, diante da possibilidade de utilização de recursos para o financiamento de atos ilícitos e antidemocráticos, com objetivo de interromper a lesão ou ameaça a direito”.
No dia anterior, Moraes havia rejeitado o pedido para enviar a investigação para a 1ª Instância. Disse ser “absolutamente prematuro” reconhecer que a Corte não tem competência para o caso. O magistrado citou que a PF ainda não terminou de analisar os elementos colhidos nas buscas e quebras de sigilo.
AÇÃO
A ação proposta pela Polícia Federal e autorizada pelo STF teve origem na publicação de uma reportagem no portal de notícias Metrópoles, de propriedade do ex-senador por Brasília Luiz Estevão. O colunista de política Guilherme Amado divulgou imagens de diálogos de um grupo privado no aplicativo de mensagens WhatsApp.
Esses “prints” mostravam que alguns empresários falavam em golpe de Estado caso o vitorioso na eleição presidencial de 2022 fosse Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e não Jair Bolsonaro (PL).
Em 9 de setembro, Moraes decidiu ignorar um pedido da PGR (Procuradoria Geral da República) para anular a decisão que autorizou a PF a fazer operações de busca e apreensão contra os empresários.
O ministro entendeu que a solicitação do órgão foi feita fora do prazo e rejeitou o pedido. Nem entrou no mérito do que requereu a PGR.
A procuradoria afirmou que o ministro violou o sistema acusatório ao autorizar a operação de busca e apreensão e que o magistrado é incompetente para atuar no caso. Pede que a decisão seja anulada, assim como as medidas tomadas contra os empresários. Eis a íntegra da solicitação (765 KB).
Segundo a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, que assinou o documento, a decisão de Moraes foi tomada “exclusivamente” com base em “matérias jornalísticas” que não “evidenciam a conexão” com inquéritos que estão sobre a relatoria do ministro.
De acordo com ela, o Supremo não deve atuar no caso, uma vez que os empresários não têm foro privilegiado. Ou seja, Moraes seria incompetente para decidir contra o grupo.