O jurista Ives Gandra da Silva Martins concedeu entrevista ao vivo para o Jornal da Manhã, da Jovem Pan News, para falar sobre ativismo judicial no Brasil e riscos à liberdade de expressão. Questionado sobre a ação autorizada pelo Supremo Tribunal Federal de busca e apreensão na casa de empresários suspeitos de articular um golpe de estado no Brasil, ele disse ver interpretações equivocadas da Constituição Federal, na medida em que os magistrados não teriam poder para decretar a ação, mas somente o Ministério Público, que é responsável por acusar e investigar crimes. “E entendo que, efetivamente, nós estamos em uma democracia, não aquela do Constituinte fez, que deu liberdade de expressão para todo mundo dizer o que bem entendesse, desde que não pegasse em arma… mas ao contrário, nós estamos tendo uma democracia na qual pode-se dizer democraticamente o que o Supremo entende que é a democracia. Estamos vivendo, efetivamente, a meu ver em um cerceamento de defesa, com todo respeito que eu tenho aos ministros do Supremo, fazendo com que a democracia seja não o que os constituintes puseram na Constituição. As vezes eu tenho a sensação de que é uma nova Constituição que estão escrevendo, um novo código penal. A título de dar uma interpretação construtiva da Constituição, nós estamos tendo uma reformulação daquilo que os constituintes fizeram. Com respeito que eu tenho aos ministro, não concordo com a interpretação deles”, afirmou Gandra.
O jurista também comentou sobre o uso do regimento interno do STF como argumento dos magistrados para executar uma série de ações, sendo que o documento é anterior à criação da Constituição Brasileira. “Um tema pouco debatido é sobre regimento interno, feito pelo Supremo antes da Constituição Federal declara, no artigo 43, que nos crimes internos do prédio do STF, eles podem tomar medidas de criminalização de quem violou a lei penal. E, se for externamente, permite ao Supremo passar para o Ministério Público, para os órgãos competentes. O que ninguém coloca é o que está no artigo 109 da Constituição, que diz que ação penal é competência privativa do Ministério Público. Só o Ministério Público pode iniciar. Grande parte dos Constituintes fazem distinção entre privativo e exclusivo, eu não faço. Na exclusividade, o poder que tem competência exclusiva não pode delegar e na privativa pode. Mas quem pode delegar é o poder, não o Supremo se autorizar uma delegação que só poderia ter sido dada pelo Ministério Público. Do ponto de vista constitucional, independente da admiração que eu tenha, dos livros que eu tenha escrito com o Alexandre, gosto muito dele, é um ministro, do ponto de vista doutrinador, tem um trabalho, uma obra solida, mas do ponto de vista da atuação nesses casos, de manutenção de três anos de um inquérito, de não aceitar o PGR pedindo o arquivamento, de ter proposto, e o Supremo ter aceito, uma prisão por manifestação de um deputado, por mais deslocada que fosse, condenando por mais de 80 anos por ter falado. A liberdade de expressão, que foi uma das grandes conquistas do constituinte… Então, eu estou, na minha sensação de um velho constitucionalista, eu discordo da orientação do Supremo”, disse.
Ainda sobre a Constituição, ele defendeu que os constituintes determinam uma espécie de liberdade de expressão sem limites. “Houve ontem uma busca e apreensão na casa de Sergio Moro, pedida pelo PCB (sic) e pelo PT. O Partido Comunista Brasileiro, o próprio nome já está dizendo, comunista. De onde surge o comunismo? Do Marxismo. E o que o Marxismo fez em todos os países Marxistas foi implantar ditaduras. E dentro do Brasil nós aceitamos que é um partido cuja a origem é sempre a ditadura. Partido que toma o poder democraticamente para depois transformar numa ditadura, como acontece na Nicaragua, na Venezuela. Mas nós admitimos essa liberdade de expressão ao ponto de o partido entrar em juízo e conseguir que determinassem uma busca e apreensão para pegar material de propaganda do doutor Sergio Moro. O que vale dizer é que a liberdade de expressão foi definida amplamente. Não é possível um abuso cuja as ações permitidas são indenizações por danos morais ou denunciação caluniosa, mas nunca tomaram decisões anteriores como uma série de medidas tem sido tomadas”, disse.
“Nós temos hoje no STF uma tendência de intervenção política. Partido de oposição quando perdem votações no Congresso correm ao Supremo para obter respaldo. Eles tem interferido diretamente. Estão numa interpretação de atuar nos vácuos legislativos ou corrigir os rumos do Executivo, pensando que isso é função do Supremo, como espécie de superpoder, aquele poder regulador de uma democracia no país. Todos sabem que não há possibilidade de golpe no Brasil sem Forças Armadas. E o Supremo sabe que as Forças Armadas jamais fariam um golpe de estado. A sensação que eu tenho é que essa atuação [do STF] mesmo que, eu estou convencido de que eles estão atuando achando que isso é bem para o país, é um problema de democracia no conceito deles, não foi o que foi aprovado na constituinte (…) Eu tenho a impressão que, desde que o Supremo deixou de ter aquela função de ser o legislador negativo e não interferir no processo político e sentiram a necessidade de interferir, que nós estamos vivendo numa instabilidade jurídica muito grande“, pontuou Gandra.
FONTE:jvpan